Fidel comenta a Geórgia: Carne de canhão para o mercado
O grande líder cubano Fidel Castro afirmou que o governo da Geórgia não teria lançado jamais suas forças armadas contra a capital da República Autônoma da Ossétia do Sul no amanhecer de 8 de agosto, em ação denominada como de restabelecimento da ordem constitucional, sem um acerto prévio com o presidente dos Estados Unidos, George W. Bush. Veja a íntegra da reflexão especial de Fidel para o site digital Cubadebate , intitulado Bucha de canhão para o mercado.
Talvez alguns governos desconheçam os dados concretos, por isso nos pareceu muito oportuna a mensagem de Raúl marcando a posição de Cuba. Discorrerei sobre aspectos que não podem se abordados numa declaração oficial precisa e breve.
O governo da Geórgia não teria lançado jamais suas forças armadas contra a capital da República Autônoma da Ossétia do Sul no amanhecer de 8 de agosto, em ação denominada como de restabelecimento da ordem constitucional, sem um acerto prévio com Bush. No passado mês de abril, em Bucareste, Bush comprometeu seu apoio ao presidente Saakashvili para a entrada da Geórgia na Otan, o que equivale a um punhal afiado que tentam fincar no coração da Rússia. Muitos Estados europeus que pertencem a essa organização militar se preocupam seriamente com a manipulação irresponsável do tema das nacionalidades, cheio de conflitos potenciais, que na própria Grã-Bretanha pode dar espaço à desintegração do Reino Unido. A Iugoslávia foi dissolvida por essa via; os esforços de Tito por evitá-lo foram inúteis após sua morte.
Que necessidade havia de se acender o barril de pólvora do Cáucaso? Quantas vezes irá o cântaro à água antes de se quebrar? A Rússia continua sendo uma poderosa potência nuclear. Possui milhares de armas desse tipo. Devo recordar que, por outro lado, a economia do Ocidente extraiu ilegalmente daquele país mais de US$ 500 bilhões. Se a Rússia não significa hoje o fantasma do comunismo; se já não apontam diretamente para alvos militares e estratégicos da Europa as mais de 400 plataformas nucleares que foram desmanteladas com o desaparecinebto da URSS, por que o empenho em cercá-la com um escudo nuclear? O velho continente também precisa de paz.
As tropas russas que se encontravam na Ossétia do Sul estavam deslocadas em uma missão de paz reconhecida internacionalmente. Não disparavam contra ninguém.
Por que a Geórgia escolheu o dia 8 de agosto, quando se inauguravam os Jogos Olímpicos de Pequim, para ocupar Tsjinvali, a capital da república autônoma? Nesse dia 4 bilhões de pessoas em todo o planeta presenciaram pela televisão o maravilhoso espetáculo com o qual a China inaugurou esses jogos. Só o povo dos Estados Unidos não pôde desfrutar nesse dia da transmissão direta e ao vivo da estimulante festa de amizade entre todos os povos do mundo que ali se encenou. O monopólio sobre os direitos de transmissão havia sido adquirido por um canal de televisão, por US$ 900 milhões, e ele desejava obter o máximo de benefício comercial por minuto de transmissão. As empresas competidoras ganharam destaque divulgando nessa hora as notícias da guerra no Cáucaso, que não eram exclusivas de ninguém. Os riscos de um conflito sério ameaçavam ao mundo.
Bush sim pôde desfrutar do espetáculo, como convidado oficial. Ainda no domingo (10), dois dias e meio depois, foi visto agitando bandeiras, fingindo ser caudilho da paz e preparado para se deleitar com as vitórias dos magníficos atletas norte-americanos, que seus olhos, acostumados a tudo desprezar, viam como símbolo do poder e da superioridade de seu império. Em seus momentos de lazer, ele manteve longas conversas com os funcionários públicos subordinados em Washington, ameaçava a Rússia e alentava os discursos, humilhantes para esse país, do representante dos EUA no Conselho de Segurança das Nações Unidas.
Alguns dos países que integravam o campo socialista ou eram parte da própria URSS hoje atuam como protetorados dos EUA. Seus governos, impulsionados por um ódio irresponsável contra a Rússia, como a Polônia e a República Tcheca, alinham-se em posições de apoio total a Bush e ao ataque surpresa contra a Ossétia do Sul por Saakashvili – um aventureiro de estranha história que, tendo nascido durante o socialismo em Tbilisi, capital de seu país, formou-se como advogado numa universidade de Kiev, realizou cursos de pós-graduação em Estrasburgo, Nova York e Washington. Exercia essa profissão em Nova York. Configura-se como um georgiano ocidentalizado, ambicioso e oportunista. Retornou ao seu país apoiado pelos ianques e pescou no rio agitado da desintegração da União Soviética. É eleito presidente da Geórgia em janeiro de 2004.
Depois dos EUA e da Grã-Bretanha, a Geórgia é o país que mais soldados tem na aventura bélica do Iraque, e não o faz precisamente por espírito internacionalista. Quando Cuba, ao longo de quase dois decênios, enviou centenas de milhares de combatentes para lutar pela independência e contra o colonialismo e o apartheid na África, não buscou nunca combustível, matérias primas nem mais-valia; eram voluntários. Assim se forjou o aço de nossos princípios. Que fazem no Iraque os soldados georgianos afora apoiar uma guerra que custou ao povo iraquiano centenas de milhares de vidas e milhões de danificados? Que ideais foram defender ali? É muito lógico que cidadãos da Ossétia do Sul não desejem ser enviados como soldados para combater no Iraque ou outros pontos do planeta ao serviço do imperialismo.
Saakashvili por sua própria conta jamais teria se lançado na aventura de enviar o exército georgiano para a Ossétia do Sul, onde se chocaria com as tropas russas ali instaladas como força de paz. Não se pode brincar com a guerra nuclear nem premiar o fornecimento de carne de canhão para o mercado.
Esta reflexão estava elaborada quando Bush falou, às 17h30, hora de Cuba. Nada desdiz o que aqui se analisa; só que a guerra midiática do governo dos EUA é hoje mais intensa ainda. É a mesma manobra préfabricada que não engana ninguém.
Os russos declararam com absoluta clareza que a retirada dos invasores parea seu ponto de partida é a única solução decorosa possível. Tomara que os Jogos Olímpicos possam continuar sem serem interrompidos por uma gravíssima crise. A partida de voleibol feminino [de Cuba] contra uma boa equipe dos EUA foi fenomenal, e o beisebol não começou ainda.
Fidel Castro Ruz
11 de agosto de 2008, 18h2.
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