Centrais e empresários traçam agenda contra desindustrialização
Representantes das centrais sindicais e do empresariado oficializaram nesta segunda-feira (27), em São Paulo, o calendário de lutas para enfrentar o problema da desindustrialização no país.
Entre março e maio, trabalhadores e patrões estarão nas ruas de alguns estados para debater com o restante da sociedade a grave situação da indústria e suas consequências para o desenvolvimento da nação. Para iniciar esse processo, as entidades decidiram também lançar um manifesto em defesa da produção e do emprego nacionais.
Para o presidente da CTB, Wagner Gomes, a partir do momento em que trabalhadores e empresários estiverem nas ruas, haverá um cenário muito claro diante de toda a sociedade. “De um lado teremos o setor produtivo; do outro estarão os especuladores. Para que lado o governo irá?”, questionou o dirigente.
Wagner Gomes, que esteve acompanhado do vice-presidente Nivaldo Santana e do secretário de Imprensa e Comunicação da CTB, Eduardo Navarro, destacou que há também uma luta interna no governo sobre o rumo necessário para o Brasil se desenvolver. “Este nosso pacto entre trabalhadores e empresários tem força para definir esse rumo, pois a briga é bastante complicada. Os rentistas certamente não vão ficar apenas olhando. Certamente eles tentarão nos dividir”, sustentou.
Ausência ministerial
Inicialmente, a reunião desta segunda-feira deveria ter contado com a presença do ministro da Indústria e do Desenvolvimento, Fernando Pimentel. Havia o interesse de empresários e sindicalistas em debater com uma autoridade do governo federal o problema da desindustrialização. No entanto, na última sexta-feira soube-se por meio da assessoria do Ministério que Pimentel não viria.
A ausência de Pimentel gerou críticas durante a reunião. “Não deveríamos estar em lados opostos. Precisamos de todos unidos”, afirmou o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, Paulo Skaf, anfitrião da reunião. Paulo Pereira da Silva, presidente da Força Sindical, criticou a postura do governo ao evitar o debate.
“Para parte do governo, o atual cenário está OK. Mas nós temos pressa, pois empresas estão fechando e não é de hoje que temos alertado o governo”, afirmou. “Se a pauta da reunião fosse o agronegócio, certamente Pimentel estaria aqui”, criticou o presidente da CUT-SP, Adir dos Santos.
Calendário e manifesto
Os representantes das centrais e do empresariado já definiram quatro importantes datas para se manifestarem contra a desindustrialização. Santa Catarina será o primeiro estado, em 28 de março. No dia seguinte (29/3), será a vez do Rio Grande do Sul. Em 4 de abril, São Paulo. Em 10 de maio, Brasília.
Além desse calendário (que ainda pode ser ampliado, já que outros estados podem levar a campanha às ruas), as centrais e os empresários definiram a redação final de um manifesto, chamado de “Grito de alerta em defesa da produção e do emprego brasileiros”, documento no qual reúnem sua análise sobre o atual cenário industrial brasileiros e expõem sua proposta para enfrentar essa situação.
Para os líderes sindicais e empresariais, é preciso trazer a sociedade civil para esse debate, de modo a convencer a população dos riscos envolvidos. “Nosso movimento precisa fazer com que todos percebam qual é o Brasil que queremos”, afirmou o presidente da UGT, Ricardo Patah. “A unidade que estamos construindo aqui é algo que está no centro do desenvolvimento do Brasil”, destacou o presidente da CGTB, Ubiraci Dantas.
Por sua vez, Luiz Aubert Neto, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), resumiu com propriedade as intervenções dos empresários presentes à reunião. “Não tem governo no mundo que não se mova a partir de pressão. O governo Dilma tem que ver que há algo diferente aqui, ver que nossa movimento não é brincadeira”, finalizou.
Leia abaixo o manifesto:
Grito de alerta em defesa da produção e do emprego brasileiros
A estagnação da indústria de transformação em 2011 é algo
extremamente grave e preocupante. Por este motivo, entidades patronais e de
trabalhadores se unem para ressaltar que apesar do forte crescimento do
consumo, o setor industrial reduziu drasticamente a geração de empregos,
agudizando ainda mais o processo de desindustrialização no Brasil.
Juros altos, câmbio valorizado, guerra fiscal favorecendo as
importações, entre outros fatores, incentivam artificialmente a entrada de
produtos importados, fazendo com que a indústria pouco contribuísse para o
crescimento do PIB em 2011. Como consequência, o crescimento total da
economia deverá ficar abaixo de 3%, após crescimento de 7,5% em
2010.Esses dados revelam o descompasso entre as ações promovidas pelo
governo, e a realidade da indústria que demanda medidas emergenciais e
efetivas.
A desindustrialização não se iniciou nos últimos anos, mas vem se
intensificando desde 2008. Em 1985, a indústria de transformação representou
27% do PIB, em 2011 deve ter chegado a menos de 16% e mantida a atual
situação, chegaremos ao fim de 2012 com menos de 15%. O declínio da
indústria coloca o país numa situação perigosa e vulnerável, com dificuldade de
gerar empregos de qualidade e salários decentes para as presentes gerações
e para as vindouras. Não se pode ignorar o impacto futuro que a redução da
atividade da indústria brasileira, e da capacidade de consumo dos
trabalhadores afetados, poderá ter sobre a expansão sustentável do emprego
no comércio e serviços.
Não há como negar a importância da indústria para a transformação
social de uma nação e a melhoria nas condições de vida de seus habitantes.
Educação de qualidade, serviço de saúde eficiente, maior oferta de habitação
e transporte, segurança e salários dignos são realidades dos habitantes de
países ricos, que não descuidam de sua indústria, pelo contrário, defendem-na
e incentivam-na com unhas e dentes, pois sabem que o setor industrial é vital
para o desenvolvimento e bem estar da sociedade, senão, vejamos a atual
posição do governo norte-americano conclamando para a defesa e
recuperação da indústria de seu país.
Infelizmente o Brasil não tem dado a devida atenção àquilo que
arduamente construiu. Basta lembrar que em 1980 o parque industrial brasileiro
era equivalente aos parques de Tailândia, Malásia, Coréia do Sul e China
somados. Em 2010, a indústria brasileira representou menos de 8% em
comparação com as indústrias desses mesmos países.
Estamos regredindo e voltando a ser uma economia produtora e
exportadora de produtos primários, cujas cotações dependem dos humores da
economia internacional. As mercadorias importadas invadem nosso mercado,
enquanto as exportações de produtos industrializados se reduzem. Em 2011, o
déficit na balança comercial de manufaturados foi de US$ 93 bilhões.
Em 2030 o Brasil contará com uma população economicamente ativa de
150 milhões de pessoas. Precisamos, desde já, fortalecer os setores que serão
capazes de gerar emprego de qualidade para esse contingente de brasileiros.
As atividades do setor financeiro, da moderna agricultura e da extração mineral
expandiram-se e tornaram-se economicamente importantes, porém sem uma indústria pujante não teremos capacidade de gerar postos de trabalho decentes
na quantidade que o Brasil demandará no futuro próximo.
O ano de 2012 se inicia com a atividade industrial estagnada, com
perspectivas de crescimento anual próximo a zero. Neste cenário, mesmo que
a demanda continue em expansão, novamente a economia brasileira como um
todo não terá forças para crescer acima de 3%.
A sociedade brasileira não pode se comportar de forma passiva e
resignada ante a tudo isso, como se décadas de desenvolvimento e a história
nada significassem. Neste momento de crise internacional, crescimento de
demanda é uma das coisas mais raras do mundo. Precisamos garantir que a
demanda brasileira seja atendida pela produção brasileira, gerando empregos
de qualidade e melhorando a distribuição de rendano Brasil.
Visando contribuir para a construção de um Brasil próspero e com boas
oportunidades para todos, é que estamos reunidos - representantes dos
trabalhadores e dos empresários - para este alerta em defesa da produção
brasileira e de um ambiente econômico favorável ao crescimento.
Assinam este manifesto:
FIESP/CIESP, Força Sindical, UGT, CTB, CGTB, CNM/CUT,
Sindicato Metalúrgicos de São Paulo, Sindicato dos
Metalúrgicos do ABC, SINAFER, SIMEFRE, SINDITEXTIL/ABIT,
ABINEE, ABIMAQ, ABIQUIM, ABIPEÇAS, SICETEL, FIEP, FIEMG.
MEDIDAS EMERGÊNCIAIS PARA RETOMADA DA INDÚSTRIA NACIONAL
I - MEDIDAS MACROECONÔMICAS
1- Redução da taxa básica de juros;
2- Redução do Spread;
3- Adotar medidas urgentes para atenuar a sobrevalorização cambial.
II- INVESTIMENTO PRODUTIVO COMO PROMOTOR DO CRESCIMENTO
ECONÔMICO
4- Desoneração integral do investimento produtivo de todos os tributos
federais e estaduais;
5- Conteúdo local mínimo efetivoem todas as compras governamentais e
privadas quando beneficiadas por financiamento público e/ou
incentivos fiscais, e em setores estratégicos;
6- Disponibilização de linhas de financiamento com volume adequado e
custos isonômicos aos concorrentes internacionais;
7- Perenização do PSI
8- Incentivar linhas de financiamento de longo prazo pelo setor bancário
público e privado.
9- Utilização do compulsório não remunerado como instrumento de
incentivo ao desenvolvimento de linhas privadas de financiamento de
longo prazo.10-Utilização das compras governamentais, inclusive da Petrobras, como
indutoras da produção nacional, da agregação de valor e da geração
de emprego e renda, com aplicação de margensde preferência para
todos os setores industriais em percentuais que efetivamente
incentivem a produção nacional.
11-Inovação tecnológica: extensão dos incentivos fiscais a todas as
empresas, independente do regime de tributação (simples, lucro
presumido e lucro real) da indústria de transformação, e oferta de
financiamento com volume adequado e custos isonômicos aos que
dispõem os concorrentes internacionais.
III- DEFESA COMERCIAL - INVERSÃO DO ATUAL QUADRODEINVASÃO
DAS IMPORTAÇÕES NO MERCADO BRASILEIRO
12-Fortalecimento das estruturas do MDIC relacionados à defesa comercial
(DECOM, DECEX e DEINT), assegurando os recursos humanos e
materiais necessários.
13- Disponibilizar as informações das operações de importação e
exportação, como forma da sociedade fiscalizar operações de
comércio exterior;
14- Incrementar o uso de instrumentos de defesa comercial, incluindo
medidas compensatórias, licenças não automáticas, valoração
aduaneira, salvaguardas e antidumping.
15-China: manter o tratamento como economia que não opera em
condições predominantes de mercado e definir medidas de defesa
comercial específicas.
16- Implementar a abertura e a aplicação de medidas de defesa comercial
comfundamento em ameaça de dano.
17- Aprofundar a regulamentação técnica, sanitária e fitossanitária, bem
como assegurar a fiscalização de seu comprimento por parte das
importações.
IV - FIM DOS INCENTIVOS FISCAIS ÀS IMPORTAÇÕES
18- Guerra dos portos: Aprovação da resolução 72 do Senado Federal,
com definição na própria resolução do conceito de industrialização
conforme art.4º, inciso I, do RIPI, e alíquota residual de 4% na origem.
19- Regimes tributários especiais: Fim dos incentivos concedidos às
importações.
V- CRESCIMENTO INDUSTRIAL COMO PRIORIDADE DA POLÍTICA
ECONÔMICA – METAS E CONTRAPARTIDAS
20-Criação de metas anuais de aumento do nível de emprego na indústria
de transformação.
21-Definição de metas anuais de crescimento da produção física e da taxa
de investimento da indústria de transformação.
22-Incorporação dessas metas como objetivo prioritário da política
econômica.
Fonte: www.vermelho.org.br
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